domingo, 8 de fevereiro de 2015

O que os jogadores querem?

Meu primeiro grupo de RPG!
O que nós, jogadores, queremos de vocês, narradores/mestres/dms/gms?

►Que você se divirta
Sério! Não narra por obrigação! Se você está sem ideias, sem saco ou ainda não está pronto... Se sabe que a sessão vai ser arrastada e interrompida o tempo todo... Não marca jogo! É uma bosta separar meu dia pra jogar e... não jogar! Nós jogadores sabemos quando você não está se divertindo. Quando o seu humor azeda, toda a aventura azeda. Um mestre entediado não tem apego pelo jogo, mas pode ter um de nós que está mega empolgado com a história.
Algumas vezes, a sua falta de empolgação é culpa nossa. Se for o caso, conta-nos! (Mas sem meter o dedo na nossa cara e nos acusar, porque nós VAMOS nos defender de cada coisa que você disser). “Amigos são como espadas que se afiam pelo atrito” e antes de sermos “seus jogadores”, somos seus amigos. Sabemos que você gasta sua semana preparando a nossa diversão, mas não somos parasitas.

►Variedade
Mesmo que nossa mesa seja do mesmo sistema/cenário ad infinitum, o gênero da história pode (e deve) variar. Uma mesma campanha pode ter uma fase bastante aventureira, Hack’n’Slasher, depois os personagens (sobreviventes) podem chegar em um local mal assombrado e entrarmos num clima de horror em que nossas espadas não sirvam pra muita coisa... e depois cair na estrada, numa aventura meio “road trip” fugindo da tecnocracia... aí nos envolvermos com uma parte mais política do mundo... e ter que entrar numa masmorra de novo... Essa montanha russa de estilos faz com que a gente sinta que nossos personagens passaram por tudo e são experientes. Também deixa o nosso raciocínio rápido e faz nosso grupo ter que enfrentar um desafio velado que é o da adaptação. Além de movimentar a mesa e nunca nos deixar na mesmice, você agrada cada um de nós jogadores que gostamos de estilos diferentes. O jogador “George Martin” vai poder bancar o Tyrion enquanto o jogador “moedor de carne” vai ter a chance de espalhar miolos pelas paredes. Vai ser muito mais difícil alguém enjoar da campanha, mesmo que ela seja longa.

►Que joguemos em modo co-op e não versus
“Quer conhecer um homem, dê poder a ele”. Essa frase é tanto pro jogador quanto pro mestre! Nós temos acesso a material pra criar personagens recheados de combos abusivos (especialmente em D&D), assim como o mestre tem o poder de falar “Rola HT/Fortitude/Vigor pra não ter um infarto fulminante AGORA!”. Quando esses são os termos do jogo, a diversão está fadada a ruir e o jogo (não a aventura) está fadado a virar uma guerra. Vai ter bate-boca, horas de discussões intermináveis sobre regras, vai todo mundo parar o jogo pra futucar livro, fórum, o diabo-a-quatro... e uma aventura que poderia ser iradíssima vai virar um evento chato com um bando de nerd batendo boca (e a gente faz isso muito bem)...
Não (ab)use do seu poder pra frustrar todos os nossos planos de sacanagem. Quando eu crio um personagem pra jogar no seu cenário de campanha, eu estou trabalhando com você pra enriquecer seu cenário (porque, mesmo que a gente esteja jogando juntos em um cenário pronto como Tormenta, cada “Arton” é única e especial). Meu personagem, um dia, pode ser um dos seus NPCs que você tanto valoriza e se o seu cenário próprio concretizar o sonho distante de virar um livro, minha contribuição de criatividade vai estar lá.

►História + Bom Senso > Regras
Todo sistema tem falhas (até o GURPS, por mais incressa que parível!) e essas falhas podem (mas não devem) ser exploradas. Você odeia quando nós o fazemos (com toda razão) e, no bate papo, chegamos a um senso comum em prol da história.
Do mesmo jeito que nós abdicamos de certas regras que vão beneficiar nossas fichas, é muito gostoso quando você deixa de lado alguma regra que vai nos prejudicar... Tem horas (porque é LÓGICO que isso não tem que ser o tempo todo) que vale a pena deixar um druida virar um pássaro gigante antes do nível por uma cena - um mísero momento em que ele pode salvar um companheiro de cair de um penhasco em uma cena épica que vai ficar na memória do grupo (dentro e fora do jogo) e vai dar pra esse druida uma razão pra buscar uma iluminação e dar gás pra ele dominar esse poder que ele já descobriu que há dentro dele.

►Que você seja FÃ do meu personagem!
É isso!!! Acho que esse é o maior ponto! Seja fã do meu personagem! Torça por ele como quem torceu pelo Ned Stark e, se eu morrer por causa das minhas decisões ou azar nos dados, nós vamos nos lembrar juntos do grande personagem que pereceu... Quando você torce por nós, você prepara desafios pra testar a moral dos nossos personagens e não somente as fichas. Quando isso acontece, a gente aprende a diferenciar um NPC babaca da babaquice do mestre e você nunca mais vai ser acusado por estar agindo extra-jogo pra ferrar a gente. Vamos todos nos sentir especiais dentro do seu mundo e ele vai se tornar um lugar especial pra nós.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

Ninguém Pode Comigo

Se essa é a interpretação honesta da sigla NPC nas suas aventuras, meu amigo... Você mestra ERRADO!

RolePlaying Game e um Game de RolePlay, certo? Um jogo onde o jogador interpreta seu personagem. Duas ou mais mentes criativas se juntam pra tecer uma história em conjunto. O que toda boa história precisa? Um protagonista. Toda história tem o seu protagonista. Às vezes o protagonista é uma catedral ou um anel, mas em todas as outras é uma pessoa (ou um grupo de pessoas). Quando o mestre esquece que o protagonista é o jogador, a diversão acaba.

Vou entrar um pouco no estudo de mitos e técnicas deroteiro de Christopher Vogler aqui e adaptar um pouco isso para a narrativa de jogos interativos e não de histórias prontas. Em qualquer história, os protagonistas (os jogadores) encontram numerosos coadjuvantes (NPCs) que impulsionam a sua jornada:

1.       Mentor
É triste a quantidade de narradores que tornam seus jogadores reféns dos seus NPCs todo-poderosos e tornam uma história que poderia ser tão boa em tédio e frustração. Claro que todos os universos existe um Gandalf/Obi-Wan Kenobi/Sr. Miyagi, pois é importante pro jogador saber que há alguma força maior do que ele na qual ele pode se garantir em algum momento. Especialmente se o jogador decidir quando é esse momento. De vez em quando é bacana ser salvo pelo grande mestre numa hora em que a morte é certa, os dados estão de sacanagem, ou o grupo tentou abocanhar uma preza maior do que consegue mastigar. Mas é um erro muito crasso fazer com que cada mínimo desafio seja tão intransponível que os jogadores sintam que são inúteis e que o grande mestre não precisa deles pra nada. Sempre dê uma fraqueza pra esse mestre. Pode ser velhice, um contrato, algum lugar que dependa da presença constante desse mentor... alguma kryptonita pra que os jogadores façam o trabalho de protege-lo de vez em quando e pagar um pouco dessa dívida. É isso, essa cumplicidade, que torna o NPC querido pelas pessoas que estão jogando. É bom ter em quem confiar.

2.       Aliados
Os NPCs são a cor do mundo. São o que torna o jogo uma experiência mais pessoal e mais profunda. Os NPCs existem para se relacionar com os PCs. Cada um deles serve pra ambientar, guiar, desafiar e instruir. Há NPCs que são “apenas” background (e esses costumam ser os preferidos dos jogadores), como os pais de um PC, esposa, filhos, amigos não-combatentes... Eles podem ser poderosos aliados simplesmente por proporcionarem ao Herói um lugar de descanso, onde ele pode se recuperar das feridas e se preparar pro próximo desafio. Os NPCs não combatentes são sempre os mais ricos, porque são os mais realistas. Tenha certeza que todo jogador tem pelo menos um em sua vida pessoal. É bom ter “fãs”.

3.       Sub-chefe
Nem todo vilão é O VILÃO, certo? Nem todo inimigo que os PCs enfrentam é o “endgame” do narrador. Se for, crie rápido uma galeria de vilões menores pro seu Voldemort. Sauron que aparece demais perde a força! Cada grande campanha tem várias etapas e até aventuras “onde-shot” dentro de dungeons tem mais de um andar. Cada andar/etapa costuma ser coroado com um inimigo mais forte, uma herança que recebemos dos videogames desde os anos 80. Esses bosses PRECISAM SER derrotáveis. Muitas vezes eu, quando estou narrando, gosto de usar cada antagonista desses pra irritar e desafiar um jogador específico. Amarro-o à vida de um jogador e torno-o um nêmeses pessoal só pra ouvir os palavrões animados quando este é derrotado. Mas é IMPORTANTE que ele seja derrotado. É fundamental que os jogadores possam, sozinhos, se livrar de seus problemas. É isso que dá a sensação de “avançar” na história. Ver os desafios sendo vencidos um a um. Isso é o “crescendo” até o clímax, onde o Bowser vem pessoalmente lutar contra o grupo. Os cavaleiros tiveram que passar por doze casas antes de enfrentar o Mestre. É bom se vingar, de vez em quando.

4.       Arauto
Alguns NPCs não tem nada contra o grupo e nem nada a favor do vilão. Às vezes eles guardam um lugar, às vezes eles só viram coisas que o grupo não viu ainda. Esses NPCs não costumam ser combatentes. Eles alertam o grupo de perigos futuros. Criam a expectativa do que vem por aí. Um viajante que cruza os PCs na direção de onde eles vieram, uma estátua falante, uma esfinge, talvez... Há NPCs que intrigam o grupo, os dá vontade de investigar e conhecer mais do seu cenário de campanha. Nem tudo precisa (e deve) ser sobre combate e XP. Informação pura e simples, mesmo que venha de um desafio mental (ou, sim... se for muito pertinente, físico) é importante pra exercitar a sagacidade dos jogadores ao invés das fichas. É bom deixar os dados de lado, às vezes.

5.       Camaleão
Outra mecânica na arte de contar histórias muito divertida para nós, narradores, é o personagem que muda de cores, lado, propósito, objetivo... Vegeta, Ranger Verde, Ada Wong... Alguns NPCs tem sua própria agenda e podem se aliar aos PCs e disputarem com eles logo em seguida (ou vice-versa). Sentir que as coisas não são “preto-no-branco” dá ao jogador uma nova camada de imersão na história. NPCs que dividem opiniões são os melhores e, mais uma vez, não precisam ser combatentes e não precisam derrotar o grupo o tempo todo. É bom ser surpreendido.

6.       Antagonista
O GRANDE BOSS! Darth Sidious, Ganondorf, Sauron... Eu sempre digo que quanto menos ele aparece, mais temível ele parece. Um conselho que pode ser totalmente ignorável pelas circunstancias: GUARDE seu vilão. Suas aparições tem que ser rápidas e pontuais com o único propósito de aterrorizar os jogadores. A forma como os Sub-Chefes se comportam na frente dele, diz muito mais do que a forma como o grupo apanha dele. Mostrar que os vilões que estão no mesmo patamar dos jogadores nutrem pavor, respeito, idolatria, etc... pelo grande vilão é o meio de tecer a forma como os PCs (equivalente opostos dos sub-chefes) devem se sentir em relação a ele. Tem aventuras que pedem um primeiro confronto com esse grande vilão antes do tempo. Tem horas que o grupo só vai respeitar/temer/etc... esse cara, se sentir que é realmente impotente diante desse cara. É uma hora aceitável de usar o mentor pra ganhar tempo pro grupo fugir. É bom cruzar os ts e colocar os pingos nos is.

É importante reforçar: O trabalho de derrotar o grande vilão é DOS JOGADORES! Senão, pra que jogar? Por que não deixar os NPCs fazerem tudo sozinhos? NÃO SALVE O GRUPO COM SEU NPC FAVORITO O TEMPO TODO! Senão, o que impede o grupo de dizer “não” pra missão? “Vai lá você mesmo, Lord Tudron... Você vai nos salvar quando chegarmos lá, mesmo...” E quem tem que ditar o que é “o tempo todo” e o que é “de vez em quando”, não é o mestre. É o jogador! Ele é que sabe o quanto ele quer ajuda e o quanto ele gosta de ser a donzela em perigo. O jogo serve pra divertir o jogador. A empolgação dos jogadores tem que ser o termômetro do mestre. Quando todo e qualquer mendigo da rua passa a ser um super lutador invencível, fica claro que seu único propósito é colocar o jogador de volta nos únicos trilhos que o mestre idealizou pro carrinho correr e que ele é incapaz de se adaptar a escolhas que não previu.

Cada pixel, cada ponto de quintessência, cada átomo de uma história está sujeito ao narrador, mas todo esse poder vem com uma grande responsabilidade. O mestre tem que ter sempre em mente que quando ele recebe amigos em sua mesa, ele está convidando outro ao entretenimento que ele pode promover. Está abrindo a sua mente para as ideias que ele não teve e personagens que ele não criou com o intuito de servir o grupo com sua criatividade. Eu sempre digo que respeito muito qualquer um que disponha de seu tempo pra preparar a alegria gratuita do seus amigos. Todo narrador tem que ser respeitado, até os que ainda não pegaram o jeito.